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HISTÓRIA DE SUCESSO: Miguel Frazão #02

Foto do escritor: Congresso CEACongresso CEA

Mãe atípica: Paula Frazão | Filho: Miguel 10 anos | Residência: Seixal
Mãe atípica: Paula Frazão | Filho: Miguel 10 anos | Residência: Seixal

Em 2014, a chegada do terceiro filho, veio com muitas diferenças que anunciavam uma nova maternidade: começou com o nascimento por cesariana porque o bebé não deu a volta; um bebé que não mamava o suficiente e que não mantinha o contato visual comigo durante a amamentação; um bebé que dormia menos horas que o normal, mas que raramente chorava permanecendo no berço mesmo acordado. 


A primeira desconfiança surgiu por volta dos 7 meses, quando o Miguel ria muito, dando belas gargalhadas, mas não era para mim, ele olhava na direção da parede e não partilhava comigo essa alegria através do olhar. Aos 12 meses comecei a sentir que perdera algumas habilidades que já tinha conquistado previamente, deixou de bater as palminhas durante as canções que eu lhe cantava e deixou de balbuciar, apenas manteve “ma ma”. 


Dos médicos ouvi a famosa frase “cada criança tem o seu ritmo”, ignorando por completo os meus alertas de que algo não estava bem.  O Miguel foi um bebé muito amado e acarinhado e sempre rodeado pelos irmãos mais velhos, na altura estes estavam com 10 e 5 anos. Foi um período muito gratificante da nossa vida, que passávamos todo o tempo juntos, eu dedicava-me à família a 100% pois as crianças estavam em ensino doméstico.


As minhas suspeitas de autismo começaram por volta dos 14 meses devido às fracas interações com os irmãos e à falta de interesse do Miguel por brinquedos e por outras crianças. A fala estava também atrasada, continuava só a dizer “mamã”, foi um bebé que não gatinhou e a marcha independente só alcançou aos 19 meses após algum estímulo e treino intensivo comigo e com o pai. 


Só aos 2 anos consegui que a médica de família  referenciasse o Miguel para a Pediatria do Desenvolvimento e, por conseguinte, para a Neuropediatria no Hospital. Ainda demorou seis meses até ser chamado. Durante esse longo tempo, eu já com a minha certeza de autismo, comecei a estudar como poderia ajudar o meu filho e descobri a Análise do Comportamento Aplicada, comecei a aplicar alguns princípios na estimulação em casa e encontrei terapia intensiva baseada em ABA para o Miguel. 


Antes do início das consultas e avaliação no hospital já o meu filho fazia 15 horas de terapia semanal mais a estimulação em casa e iniciava a comunicação com o PECS. O diagnóstico médico oficial só se confirmou aos 3 anos de idade. Senti-me aliviada e grata por ter seguido o meu instinto de mãe, ter pesquisado e ter encontrado a intervenção adequada para o meu filho. 


O diagnóstico acabou por não ser um momento dramático para a nossa família, porque foi gradual, não veio de fora, foi uma descoberta interna que apenas recebeu a confirmação externa muito tempo depois. Sempre foi um assunto muito conversado e estudado em família. Envolvemo-nos todos muito na estimulação do Miguel em casa, os irmãos participavam muito, incentivavam com brincadeiras e sempre tentavam fazer o irmão rir. 


A nova realidade trouxe alterações à vida familiar, os irmãos voltaram à escola, e eu passei a ocupar-me principalmente da estimulação do Miguel em casa, mais terapias e consultas. E ainda continuar a estudar para entender mais sobre o autismo e estratégias de ensino de habilidades para poder aplicar esse conhecimento numa base diária para ajudar no desenvolvimento do meu filho. 


Encontrar uma equipa terapêutica experiente, dedicada e empenhada é fundamental para trazer à família o apoio técnico e emocional que precisamos. Rodear a nossa criança de pessoas que acreditam nela, que trabalham carinhosamente e com afinco para desenvolver o seu potencial é tranquilizante mesmo nos momentos mais desafiantes. 


Outro incremento fundamental à minha rede de apoio foi conectar-me com outras mães atípicas - com filhos de idades próximas ou um pouco mais avançadas - que lidavam com o autismo como eu. Apesar de ser uma conexão online e à distância, através das redes sociais, acabamos por criar um grupo de partilha de estratégias e conhecimento apoiando-nos umas às outras.


A vida familiar apesar de ter sofrido algumas alterações, principalmente no esforço financeiro para as terapias, procuramos sempre manter uma vida social ativa de modo a proporcionar ambientes diferenciados e oportunidades de interação social ou convívio para o desenvolvimento das crianças e para o bem da nossa saúde mental. O que nem sempre é tarefa fácil pois há dias em que o autismo decide ser produtivo e acaba com os planos previamente elaborados.


Mais tarde chega uma nova etapa. A entrada na escola. Encontrar uma escola que acolha verdadeiramente as crianças atípicas é uma epopeia! Além da falta de recursos técnicos e humanos nas escolas falta muitas vezes a boa vontade. A escola é a maior preocupação das famílias atípicas. Visitei algumas escolas, públicas e privadas, para averiguar as condições. O meu coração ficou apertado! 


Conseguimos descobrir um colégio particular na nossa área de residência, por referência de outra mãe atípica que nem conhecia pessoalmente, e o Miguel entrou lá aos 4 anos, para o jardim de infância e onde terminou o 1ºciclo. Um colégio onde fomos “felizes a valer”, onde fez muitos amigos, onde aprendeu muito e participou em todas as atividades, espetáculos, passeios e até foi à viagem de finalistas e passou 3 dias fora de casa.


O percurso do Miguel foi sempre bem planeado e amparado por técnicos competentes, todas as habilidades foram sendo adquiridas com muito trabalho diário, muitos desafios e dificuldades foram vencidos mesmo quando pareciam inalcançáveis, como foi o caso da fala. O Miguel começou a comunicar-se aos 2 anos e meio com um sistema de comunicação alternativa aumentativa – o PECS (uso de imagens) – e fazia-o muito bem. Ele soltou algumas palavras simples aos 4 anos e depois mais nenhum avanço na oralidade. 


Pensamos mesmo que o nosso filho não chegaria a desenvolver a fala, mas, duas semanas antes de completar os 6 anos de idade, a “língua desatou” e começou a falar e a fazer os seus pedidos com frases completas como tinha aprendido ao utilizar o sistema PECS. Foi uma alegria! E não só falava em português, mas também em inglês e até pelo japonês passou durante uma fase.


Atualmente o Miguel está quase a completar 11 anos de idade, fala, lê, escreve, prossegue as aprendizagens ao seu ritmo, frequenta a escola, a igreja, as festas de aniversários dos amigos, adora música, ir ao cinema, ir ao teatro, anda de bicicleta, monta a cavalo, gosta de viajar com a família e conhecer lugares novos. 


Em casa, tem já muita autonomia e funcionalidade nas atividades de vida diária, de autocuidado e participação da vida familiar e doméstica. Muitas conquistas foram alcançadas, mas muito há ainda pela frente, e sempre paira uma nuvem de incerteza sobre o futuro da nossa criança. 


Nesta jornada da maternidade atípica, sonhamos com a sua independência e autonomia na vida adulta e trabalhamos diariamente para que assim aconteça, mas preocupa-nos as alternativas, na nossa ausência, se o sonho não se concretizar. 


Contudo não deixo que essa nuvem permaneça muito tempo, e me impeça de sentir alegria na jornada, de ver o brilho que o meu filho trouxe à nossa vida e sempre procuro focar-me no que posso controlar aqui e agora, proporcionando ao meu filho experiências de aprendizagem, vivências significativas e a certeza de que é amado do jeito que ele é. 


Ter participado na primeira edição do Congresso CEA em 2024, ampliou a minha visão, fez-me ter uma perspetiva mais abrangente sobre as habilidades a desenvolver, fez-me pensar, planear e preparar para as próximas etapas da vida do meu filho, mudar abordagens terapêuticas, abandonar o contexto clínico e passar para o contexto real. 


Estou muito entusiasmada com o CEA 2025, com a oportunidade de ouvir os grandes especialistas com quem vamos ter o privilégio de aprender sobre as últimas inovações no âmbito do autismo nas diversas áreas de intervenção. Serão dois dias muito especiais com acesso a tanto conhecimento, será uma experiência grandiosa, transformadora e empoderadora, quer para as famílias como para os profissionais.


Paula Frazão no Instagram.


Para mais informações:

Rui Martins

E. rui.martins@prmarketingstrategy.com M. +351 919 923 752

 
 
 

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